Desde que cheguei a Boa Ventura, há cerca de vinte anos,
escuto falar no coronel Zuza Lacerda e a sua “República da Estrela”. Pesquisei
em algumas fontes escritas sobre essa história, conversei num passado recente com
pessoas mais idosas e fui pessoalmente conhecer de perto o velho curral do
coronel, a casa onde ele morava e a capela onde foi sepultado, junto com sua
esposa e um padre que residia com a família.
A casa foi destruída pelo tempo e falta de cuidado por parte dos
herdeiros, mas a capela continua bem zelada, até porque pertence à comunidade
católica da cidade de Curral Velho, e ainda hoje é celebrada missas no local.
Pois bem, o coronel já foi tema de matérias publicadas neste
espaço em outras oportunidades, mas eu nunca tinha visto a imagem do mesmo em
fotografias, e eis que, consegui, finalmente, uma foto antiga que mostra de
fato como era o semblante do famoso coronel Zuza Lacerda, que durante muito
tempo mandou e desmandou por essas bandas.
Como a imagem mostra, ele era de cor branca, olhos azuis,
contam que era baixinho, usava bigodes e tinha um olhar sereno, sempre olhando
para cima, numa posição de poder, ou estar com uma convicção de estar sempre
por cima. Natural do Ceará, veio para a então vila de Sãoboaventura comandando
uma boiada de dona Donária Leite, esposa do capitão Mamede.
Com o tempo, conquistou poder e fama, sobretudo depois que se
casou com a Irma do capitão Mamede, a senhora Ana Furtado de Lacerda. Contam
que em certa ocasião conseguiu vencer em uma batalha sangrenta um grupo de bandidos
conhecido por “Os Viriatos”, no limite com o Ceará. Ganhou do Governo Federal a
patente de coronel da Guarda Nacional pela conquista.
Não se sabe, ao certo, se a história da cuja “República da
Estrela” foi verdadeira ou não, mas a fama pegou e até em um hino do município de
Boa Ventura o homem é lembrado como herói. De acordo com algumas pessoas idosas
que eu conversei, o coronel tinha era muitas terras e muita gente trabalhava
para ele. Foi deputado estadual e de certa forma, tinha prestígios junto aos
poderosos da capital do Estado.
Em alguns livros, podemos encontra narrações sobre o coronel
e sua história. Contam também que tinham inimigos como o coronel Possidônio
Mangueira, de Diamante, e talvez por isso, por esconder os assassinos deste
coronel, o governador de então ficou descontente e ameaçou mandar a policia
invadir as terras do coronel e pegar os supostos criminosos.
A partir daí, dizem que ele juntou a família e alguns amigos
e proclamou a “República da Estrela”, tornando a pequena vila de Sãoboaventura
e a fazenda Curral Velho independentes do restante do estado da Paraíba. Outra
versão dá conta que “a independência” se deu pelo fato do governador, que na
época era denominado de presidente de estado, decidiu apoiar um parente seu de
Piancó para deputado, representado, assim a região, e não mais o coronel, e
este, por sua vez, decidiu romper politicamente com a autoridade maior do
estado e criar um estado independente. Três dias, contam que a cuja “independência”
durou.
E como ninguém deu ouvidos ao que acontecia por essas bandas,
que vivia sem comunicação e era habitada por um pequeno grupo de habitantes, a “República
da Estrela” acabou-se. Lamentavelmente, poucas pessoas em Boa Ventura e Curral
Velho sabem contar essas histórias, sobretudo os mais jovens, que devem cultivá-las,
não como fato de heroísmo ou não de seus personagens, mas como cultura e
tradição.
Ah, dizem que o coronel Zuza Lacerda morreu depressivo devido
a ter passado alguns dias sob o poder de alguns de seus inimigos, em uma
localidade rural, só ganhando a liberdade depois que foi feito um resgate em
forma de dinheiro e em substituição do mesmo por um de seus filhos. Talvez
a história verdadeira não seja essa, por
isso o interesse seja primordial no intuito de descobrir através das pesquisas
fatos novos que possam contar com mais detalhes histórias que cheguem mais
perto da realidade da época.
Pela tradição, ou seja, pela transmissão de narrativas dos
mais velhos para os mais novos, talvez seja difícil, pois poucos idosos dos
tempos atuais conviveram com essa realidade, mas não custa nada conversar com
os mais velhos e daí tentar extrair algo proveitoso, e depois, os livros que
falam sobre o assunto. A diga está repassada.
Delcides Brasileiro
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