Drauzio
Varella
Quando você faz um
exame de colesterol, os resultados dão o valor do colesterol total e os de três
frações: HDL, LDL e VLDL. Muitos
parede das artérias. Nesse processo, estão envolvidas praticamente todas as lipoproteínas, entre as quais as citadas acima: HDL, LDL e VLDL.
parede das artérias. Nesse processo, estão envolvidas praticamente todas as lipoproteínas, entre as quais as citadas acima: HDL, LDL e VLDL.
Nas pessoas saudáveis, essas lipoproteínas distribuem e reciclam o
colesterol. A deposição do colesterol na parede das artérias envolve as frações
LDL e VLDL. Ao contrário, sua retirada da parede arterial é executada pela
fração HDL. Nosso objetivo, no momento, é ajudá-lo a controlar os níveis de
colesterol como prevenção das doenças cardiovasculares, principal causa de
morte nas sociedades industrializadas. Para isso é fundamental caracterizar
dois parâmetros: os fatores de risco e os limites para os valores do
colesterol.
Fatores de risco
Como as heranças patrimoniais, a genética não prima pela imparcialidade.
Tive um doente de 64 anos que ingeria uma dúzia de ovos cozidos todos os dias,
desde os 18 anos, e tinha colesterol total sempre abaixo de 150. Outros não
podem sequer olhar para um vidro de maionese. Os genes que herdamos de nossos
antepassados trazem com eles fatores de risco variáveis para doença
cardiovascular.
De acordo com o National Cholesterol Education Program, os principais
fatores de risco são:
1) IDADE – Homens: 45
anos – Mulheres: Depois da menopausa
2) FUMO
3) HIPERTENSÃO: Mesmo quando
tratada
4) DIABETES
5) HISTÓRIA DE
DOENÇA CARDIOVASCULAR EM PARENTES DE PRIMEIRO GRAU: Doenças
instaladas em parentes masculinos antes dos 55 anos de idade ou em parentes
femininos com menos de 65 anos.
6) NÍVEIS DE HDL
ABAIXO DE 35 MG POR DL: Pela tabela, um homem aos 50 anos, cujo pai
teve infarto do miocárdio aos 53 anos, tem dois fatores de risco: idade e
parentesco. Se ele for fumante e tiver HDL = 30, passa para quatro fatores e
dobra o risco, embora possa considerar-se gozando de saúde perfeita.
Para manter adequados os níveis de colesterol e reduzir o risco de
ataques cardíacos ou de outras enfermidades circulatórias, há duas medidas
universais: controle do peso corpóreo e prática de atividade física. Quando
estas falham, os médicos aconselham reduzir a quantidade de gordura na
alimentação e, eventualmente, prescrevem medicamentos.
A combinação dos fatores com a tabela mostra que não há valores fixos
para orientar o controle do colesterol. Um homem de 50 anos (ou mulher na menopausa),
com colesterol total = 220 e LDL = 140, não precisa restringir gordura na dieta
nem tomar medicamentos, desde que não tenha outro fator de risco.
Se for fumante, por exemplo, terá dois fatores de risco e cairá na faixa
dos que necessitam de restrições dietéticas. Se for portador de doença
cardiovascular, o mesmo homem de 50 anos (ou mulher na menopausa) irá para o
grupo dos que devem tomar remédio.
Um exame de sangue
para prevenir ataque cardíaco
A relação entre
altos níveis de LDL, o “mau” colesterol, e de uma proteína chamada C-reativa no
sangue fornecem as explicações mais convincentes sobre as principais causas
para a instalação de placas nas artérias que irrigam o coração. Aprendi na
faculdade que ataques cardíacos aconteciam quando as coronárias eram entupidas
por placas de colesterol.
A arteriosclerose seria consequência mecânica da deposição de placas de
gordura no interior das artérias, processo irreversível e contínuo que se
iniciava a partir da adolescência. Pela teoria, quanto mais gordura no sangue,
mais rápida a velocidade de formação da placa, maior a probabilidade de
obstrução. Naquele final dos anos 1960, começava a adquirir popularidade a
determinação das concentrações das frações HDL e LDL do colesterol no sangue e
passava-se a atribuir a elas valor prognóstico: o HDL seria a fração
protetora,ou o “bom” colesterol, e o LDL, o “mau”.
Quanto mais alto o LDL, maior o risco de infarto do miocárdio (ataque
cardíaco), derrame cerebral e complicações vasculares. Esse conceito foi aceito
pelos médicos apesar de evidentes contradições:
1) Há pessoas que nunca infartam apesar de apresentarem placas extensas,
que lhes obstruem significativamente a luz das coronárias. Outras, portadoras
de placas insignificantes, com pequeno grau de obstrução, podem sofrer infartos
extensos;
2) Níveis altos de colesterol explicam apenas 50% dos episódios de
infarto; a outra metade dos eventos ocorre em pessoas com colesterol normal;
3) As estatinas, drogas que reduzem as concentrações de colesterol no
sangue, administradas a pessoas com LDL elevado, diminuem a probabilidade de
ataques cardíacos e derrames cerebrais. Mesmo indivíduos com níveis normais de
LDL, no entanto, podem beneficiar-se do uso desses medicamentos. No início dos
anos 1990, surgiu uma linha de pesquisa nos laboratórios da Universidade de
Harvard, que apresentaria explicação racional para as contradições acima e, em
poucos anos, revolucionará o campo da prevenção e do tratamento da
arteriosclerose. Das pesquisas iniciadas por esse grupo, emergiu o conceito de
que a arteriosclerose é um processo inflamatório.
Entendê-la e tratá-la como resultado do acúmulo passivo de colesterol
nas artérias é uma visão simplista, que deve ser abandonada. A formação da
placa é um processo ativo, conseqüência de uma inflamação que se estabelece no
local. As partículas de LDL em excesso que se acumulam junto às paredes
internas de uma artéria sofrem alterações químicas que induzem as células do
revestimento interno do vaso a produzir certos mediadores, que atraem glóbulos
brancos com a finalidade de digerir essas partículas alteradas.
Inicia-se, no local, uma cadeia de reações imunológicas que resultará na
deposição de uma camada formada por gordura e glóbulos brancos. Como defesa, na
superfície dessa placa gordurosa, forma-se uma cápsula protetora, densa, de
tecido fibroso, com o intuito de isolá-la e mantê-la íntegra, emparedada na
superfície do vaso, sem interferir significativamente no fluxo sanguíneo
(embora estreite a luz do vaso).
O infarto acontece não porque a placa necessariamente ocluiu a artéria
afetada, mas quando substâncias resultantes das reações inflamatórias que
ocorrem no interior da placa digerem a cápsula protetora e provocam a formação
de coágulos, que se desprendem e são levados pela corrente sanguínea. A
caracterização da arteriosclerose como processo inflamatório tem implicações
práticas da maior importância: as mesmas células e moléculas envolvidas nas
inflamações, resposta a agentes infecciosos e ao trauma, estão intimamente
ligadas à gênese do processo arteriosclerótico. Uma dessas moléculas é a
proteína C-reativa, substância presente em pequenas quantidades no sangue de
pessoas normais, mas cuja concentração pode aumentar cem ou mil vezes na vigência
de processos inflamatórios. Como a molécula dessa proteína permanece estável
por décadas no sangue estocado, nos últimos anos surgiu uma avalanche de
estudos que estabeleceram relações bem definidas entre os níveis de proteína
C-reativa e o risco de acidentes cardiovasculares.
Deles, emergiram explicações mais claras para as contradições ligadas ao
colesterol:
1) Níveis elevados de proteína C-reativa estão associados a ataques
cardíacos e a derrames cerebrais mesmo em indivíduos com LDL baixo;
2) Níveis elevados de proteína C-reativa guardam relação linear com o
número de acidentes cardiovasculares, isto é, quanto mais altos os níveis,
maior a probabilidade de acidentes;
3) Pessoas com níveis baixos de LDL e de proteína C-reativa são as que
menor risco de doença cardiovascular apresentam. Ao contrário, as que possuem
LDL e proteína C-reativa elevados apresentam risco de seis a nove vezes maior;
4) Indivíduos com LDL baixo, que mesmo assim se beneficiam com o uso de
estatinas, são justamente aqueles portadores de níveis altos de proteína
C-reativa, sugerindo uma ação antiinflamatória para essa classe de drogas. As
concentrações de proteína C-reativa no sangue são coerentes com os demais
fatores de risco para doenças cardiovasculares. Seus níveis se elevam com o
fumo, com o aumento de peso, com o diabetes, com a hipertensão arterial e com o
passar dos anos.
O álcool exerce efeito aparentemente paradoxal: os abstêmios apresentam
níveis mais altos da proteína, que caem nas pessoas que tomam um ou dois
drinques por dia e sobem significativamente nos que exageram na bebida
(distribuição que acompanha exatamente o risco de infarto). Além do colesterol,
é claro, é preciso controlar os níveis de proteína C-reativa em seus exames de
rotina.
A alimentação faz
diferença
Os níveis de triglicérides, ou gorduras, existentes no sangue variam de
acordo com o tipo de alimentação adotada. Está cada vez mais claro para os
estudiosos do problema que uma dieta rica em gordura é um dos mais graves
fatores de risco para o funcionamento das artérias que irrigam o coração.
Há mais de 40 anos, foi demonstrado que níveis altos de triglicérides
estão associados à doença das coronárias. No entanto, essas gorduras presentes
no sangue têm sido consideradas menos importantes do que certas frações do
colesterol, como HDL (o colesterol “protetor”) ou LDL (o “mau” colesterol). Em
1996, uma compilação de vários estudos demonstrou que, para cada aumento de
88,5 mg na dosagem de triglicérides sanguíneos, o risco de doença coronariana
aumenta 37% em mulheres e 14% nos homens. Os médicos têm considerado
aconselhável manter os níveis de triglicérides abaixo de 200, mas não há
unanimidade em relação a esse valor. Em 1984, o National Institute of Health,
dos Estados Unidos, aceitava como desejáveis valores até 250. Recentemente, o
Baltimore Coronary Observation Program sugeriu que níveis acima de 100 devem
ser considerados anormais. Já a American Heart Association aceita valores até
150. A dieta é fator crucial na relação entre triglicérides e doença coronariana.
Cada vez que ingerimos gordura, o nível de triglicérides no sangue
aumenta. O grau de aumento depende dos níveis basais de triglicérides. Por
exemplo, uma pessoa que em jejum tenha triglicérides igual a 80 e almoce
cheeseburger com batata frita e milkshake, poderá experimentar uma elevação
entre 15% e 20% em seus níveis.
Embora esses valores subam para 92 a 96, ainda estão dentro da
normalidade. A mesma refeição, em outra pessoa com valores basais igual a 300,
elevará os níveis para mais de 350 o que é absolutamente desaconselhável. Para
obtermos resultados laboratoriais confiáveis dos níveis basais de
triglicérides, é preciso estar pelo menos 12 horas em jejum quando o sangue for
coletado.
Além disso, existe variabilidade de 5 a 10% nos resultados de um
laboratório para outro, podendo haver até 15% de variação de acordo com a
posição em pé ou deitada no momento da coleta. Esses índices pouco afetam os
resultados daqueles que apresentam resultados dentro da faixa da normalidade,
mas podem ser significantes para os demais. Por isso, recomenda-se jejum de 12
horas, no mínimo, e colher o exame na mesma posição e no mesmo laboratório,
sempre que possível. Independentemente dessas variações, triglicérides abaixo
de 100 não requerem tratamento. No entanto, indivíduos com níveis superiores a
200 devem ser tratados. Na faixa entre 100 e 200 existe controvérsia em relação
à necessidade de tratamento.
Nesse caso, fatores como história de ataques cardíacos na família,
concomitância de hipertensão, diabetes, vida sedentária, tabagismo e níveis de
colesterol devem ser levados em consideração. Modificações da dieta são muito
eficazes no controle dos triglicérides, porque ela afeta seus níveis de forma
muito mais evidente do que os do colesterol. Enquanto evitar alimentos ricos em
gorduras saturadas (frituras e gordura animal) reduz o colesterol em apenas 5%
a 10%, os triglicérides caem de 20% a 30%. Para reduzir triglicérides é
importante, também, diminuir a ingestão de açúcares, porque o glicerol neles
presente forma o esqueleto químico das moléculas de triglicérides.
Embora o álcool pareça ter menor impacto nos níveis de triglicérides do
que se imaginava, sua ingestão concomitante com gorduras e frituras pode
aumentá-los substancialmente. O exercício físico aeróbico é fortemente
recomendado para os que apresentam triglicérides elevados. Sua prática reduz os
níveis de 10% a 20%.
Substâncias como os ácidos graxos ômega-3, presentes no óleo de peixes
como o salmão, constituem fontes alimentares importantes para quem precisa
reduzir triglicérides. Para que sejam ingeridas nas quantidades adequadas,
entretanto, é preciso comer cerca de 300 gramas de salmão por dia. Por isso,
estão sendo desenvolvidas cápsulas de ômega-3 que supram essa necessidade de
forma menos enjoativa.
Para os sedentários em que os esforços dietéticos tenham fracassado, o
tratamento farmacológico está indicado. Três tipos de drogas são utilizadas:
niacina, estatinas e fibratos. A niacina reduz os níveis de triglicérides de
10% a 30%. Doses de um a dois gramas são eficazes também para aumentar os
níveis de HDL (o colesterol “protetor”). Redução do LDL, porém, requerem doses
mais altas do medicamento. As estatinas são usadas para reduzir LDL e,
concomitantemente, os triglicérides. São especialmente eficazes quando os
níveis basais de triglicérides ultrapassam 250, pois induzem 20% a 40% de
redução (contra 5% a 10% de redução quando os níveis basais são menores do que
150).
Os fibratos podem reduzir os níveis de triglicérides de 20% a 60% nos
pacientes com colesterol total normal (abaixo de 200). Recentemente, um grande
estudo conduzido entre pessoas com colesterol normal (em média 175) e valores
médios de triglicérides iguais a 161 demonstrou que os fibratos reduziram o
número de eventos cardiovasculares em 22%, resultado expressivo, num grupo que
os médicos raramente consideram necessário tratar.
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